"As ondas de
calor extremo se intensificam no mundo, com casos dramáticos como em
partes da Europa, África e Ásia meridional, um fenômeno “ligado ao
consumismo absurdo”.
Berlim,
Alemanha, 28 de janeiro de 2013 (Terramérica).- O aquecimento da Terra
provocado pelas atividades humanas não é apenas uma realidade
indiscutível como também sofreu uma aceleração desde 1970, com
temperaturas cada vez mais altas, alertam novos estudos científicos, que
situam 2012 como o nono ano mais quente desde 1880. As jornadas recorde
de calor estival são mais frequentes e intensas do que antes de 1970,
segundo investigação publicada este mês pelo Instituto de Potsdam para a
Pesquisa do Impacto Climático (PIK).
Para este estudo, intitulado Global Increase in Record-Breaking Monthly-Mean Temperatures
(Aumento mundial nas médias mensais de temperaturas recordes), os
cientistas do PIK utilizaram o banco de dados da Nasa, a agência
espacial dos Estados Unidos, que contém os registros mensais de
temperatura no mundo desde 1880. Em média, os meses com temperaturas
extraordinariamente elevadas quintuplicaram em relação ao que se poderia
esperar se não existisse o aquecimento global de longo prazo, disse ao
Terramérica o chefe da equipe do PIK, o geofísico holandês Dim Coumou.
A
tarefa principal deste especialista desde que entrou no PIK, em 2008, é
coprojetar um sistema climático computadorizado, os chamados Earth
System Models of Intermediate Complexity (Modelos de complexidade
intermédia do sistema terrestre). Com esta ferramenta se busca “cimentar
o caminho para estudar de forma eficiente os elementos cruciais do
sistema climático terrestre, alguns dos quais poderiam atravessar, no
próximo século, um ponto de inflexão forçado pela ação dos seres
humanos”, apontou Coumou.
O geofísico disse ao Terramérica que o
estudo do PIK foi motivado pela frequência e intensidade de ondas de
calor registradas nos últimos anos, como as ocorridas em 2003 na Europa,
em 2010 na Rússia e no Sahel, a zona africana de transição entre o
Deserto do Saara e o sul mais fértil, em 2012 na América do Norte, e,
nas primeiras semanas deste ano, na Austrália. “Aplicamos nosso modelo
de análise estatística aos dados da Nasa para estudar a frequência dos
recordes de calor desde 1880 e, mais especificamente, desde 1970,
tomando em conta que, nos últimos 40 anos, aumentaram as emissões
antropogênicas de gases-estufa e o aquecimento global que causam”,
explicou Coumou.
A pesquisa comprovou que globalmente os meses
mais quentes quintuplicaram e também que a situação é ainda mais
dramática em determinadas regiões do planeta. “Em partes da Europa,
África e Ásia meridional, os meses com recordes de temperaturas altas se
multiplicaram até por dez”, garantiu Coumou, destacando que 80% desses
recordes observados não teriam ocorrido sem a intervenção humana.
Para
o sociólogo alemão Harald Welzer, os resultados desta investigação não
são uma novidade. “É claro que há muito tempo que nossa sociedade
consumista, que é o modelo econômico imperante no mundo, nos levou a um
atoleiro”, disse ao Terramérica. “Os dados sobre o aquecimento global
estão diretamente ligados ao consumismo absurdo”, insistiu Welzer,
diretor de uma fundação ambientalista dedicada a divulgar práticas
sociais e econômicas que permitam “estilos de vida melhores, mais justos
e que conduzam a mais felicidade”.
“Na Alemanha, com 80 milhões
de habitantes, a cada ano são vendidos dez milhões de televisores de
tela plana e os automóveis são tão grandes que já não cabem nos
estacionamentos”, exemplificou Welzer. Na zona oeste, a mais
desenvolvida do país, “um terço dos alimentos comprados é jogado no
lixo”, acrescentou. Para contrapor a este modelo, Welzer defende um
sistema de vida “com menos consumo, menos mobilidade, menos
prosperidade, mas também com menos trabalho, menos tensão e, por
conseguinte, mais tranquilidade”.
Um segundo estudo também
divulgado este mês, realizado pela própria Nasa utilizando seu banco de
dados, chega a conclusões semelhantes às do PIK, ao determinar que 2012
foi o nono ano mais quente desde 1880, confirmando a tendência de longo
prazo de temperaturas globais crescentes. Também estabeleceu que os nove
anos com maiores temperaturas desde então ocorreram a partir de 2000,
com exceção de 1998. O recorde é detido por 2005 e 2010. Os
pesquisadores do Instituto Goddard para Estudos Espaciais (Giss) da Nasa
indicaram que a temperatura global média de 2012 foi de 14,6 graus, 0,6
grau maior do que a média-base de meados do século 20 e 1,4 grau maior
do que a média dos últimos 132 anos.
Gavin Schmidt, climatológico
do Giss, declarou, em um comunicado da Nasa, que os números
correspondentes a um ano não são significativos em si mesmos. “O que
importa é que esta década é mais quente do que a anterior, que, por sua
vez, foi mais quente do que a que a antecedeu. O planeta está aquecendo,
e o motivo é que estamos emitindo cada vez mais dióxido de carbono na
atmosfera”, enfatizou. No mesmo comunicado, o diretor do Giss, James
Hansen, afirmou que os “dados climáticos agora estão carregados”.
Embora
algumas estações venham a ser mais frias do que média de longo prazo,
as pessoas perceptivas já terão notado que a frequência das ondas de
calor estão aumentando, e são estas temperaturas extremas as que mais
afetam a vida sobre a Terra, acrescentou Hansen. O estudo do PIK
coincide com esses alertas. Caso o aquecimento global continue no ritmo
atual, os especialistas estimam que os recordes mensais de calor serão,
dentro de 30 anos, 12 vezes maiores do que se não houvesse a mudança
climática.
Entretanto, o aquecimento será ainda maior na África
central e na região do Amazonas, alertou Coumou, que, apesar das claras
conclusões de seu estudo, negou-se a fazer recomendações aos governos e à
população em geral. “O único desejo é que os líderes políticos e as
sociedades tenham plena consciência de que a mudança climática não é um
assunto do futuro distante, e que seus primeiros impactos já estão
ocorrendo, que o aquecimento global é real e é provocado por atividades
humanas. Se todos aprendermos a agir com consciência, será muito
melhor”, ressaltou.
* O autor é correspondente da IPS.
Fonte: Envolverde
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